:: ArtigosUm novo pacto socialGaudêncio Torquato15/04/2019 15:01:00Os
desempregados no Brasil somam 13 milhões de trabalhadores. Para 2020, a
projeção é de 12,7 milhões. Dados da Organização Internacional do Trabalho.
Pelo visto, não haverá grande mudança no painel do emprego. E mais:
especialistas demonstram que o desemprego tende a crescer no mundo ante a
expansão da automação nos parques fabris e a revolução a que já se assiste no
setor de serviços.
A
hipótese, que ganha o foco de estudiosos, é de que teremos cada vez menos
emprego. E, em contrapartida, a escalada da informalidade, com o aumento de
“bicos” e trabalhadores exercendo atividades sem vínculo contratual, físico e
temporal. O impacto sobre as economias será de monta, tornando defasada a rede
de proteção social aos trabalhadores, pois os salários pagos pelo sistema
produtivo, que servem de referência tanto para cobrança de contribuições quanto
ao pagamento de benefícios – aposentadoria, seguro desemprego – darão vez a
ganhos não fixos, obtidos pelo tipo e tempo de serviço prestado.
Veja-se
o risco de ficar obsoleta uma reforma da Previdência estruturada sobre o eixo
do trabalho fixado no emprego e no salário. Nasce envelhecida. Esse é, aliás, o
alerta que faz o economista José Roberto Afonso em recente texto acadêmico. O
professor José Pastore também tem desenhado com mestria o futuro do trabalho.
Infelizmente, os nossos homens públicos ainda não perceberam que mudar o
sistema previdenciário sem considerar a nova moldura do trabalho no mundo não
equacionará o ajuste das contas do país. Por mais que se considere essa reforma
como a mais importante do governo, o fato é que ficará caduca logo, logo,
exigindo, mais adiante, uma reforma da reforma, com a inserção de nova ordem de
fatores.
Pior
é constatar que, por nossas plagas, o emprego com carteira assinada tem espaço
cativo na mente nacional. Parece ser a única forma de alguém conservar a
auto-estima: “eu tenho um
emprego”. E se o emprego estiver na órbita do Estado, melhor.
A árvore do patrimonialismo tem sido responsável pelo conjunto de mazelas que
contribuem para avolumar o chamado custo-Brasil:
o cartorialismo (a burocracia), o empreguismo/nepotismo, o desleixo, a incúria,
a anomia, a improvisação, entre outras. O empreendedorismo ainda está longe de
se consolidar como ferramenta de alavancagem dos setores produtivos.
O
homo brasiliensis
espera que o braço estatal seja seu protetor. E assim, a livre iniciativa, o
desbravamento de novas áreas, a produtividade acabam cedendo espaço para a
acomodação, a protelação de tarefas (“vamos
deixar para amanhã”), o ócio, a preguiça, o acobertamento da
ilicitude e, por consequência, a formação de teias de corrupção pela malha da
administração publica nas três esferas da Federação.
Urge,
portanto, um choque de ações, a começar pela reformulação das estruturas que
dão formação à nossa mão de obra, com atualização das abordagens de treinamento
e um direcionamento para nichos de serviços não tradicionais. Temos de
abandonar as velhas práticas e a noção de que as oportunidades do mercado de
trabalho caem sobre nossas cabeças como o maná que caiu do céu quando Deus
tirou seu povo do Egito rumo à Terra Prometida.
Temos
de substituir em nossas cabeças emprego
por trabalho. Direito ao salário pelo ganho proporcionado por
novas funções, tarefas e serviços na seara de um mercado de trabalho que se
diferencia de suas antigas estruturas.
Sob
essa paisagem, a rede de proteção ao trabalhador há de prover outras
modalidades que não apenas a carteira assinada. Sindicatos trabalhistas carecem
redirecionar rumos e ações. A velha luta de classes será substituída pela
construção de um diálogo estreito entre patrões e trabalhadores, com
identificação de seus interesses e maior parceria.
O
alvo passa a ser, portanto, um novo pacto social, cujo escopo abrigue pilares
do trabalho em suas múltiplas facetas – tempos determinados e indeterminados,
contratos individuais e plurais, serviços prestados à distância etc. As
metamorfoses do mundo do trabalho precisam ser analisadas à luz do fenômeno da
globalização, que tem puxado o carrossel de mudanças nas frentes política,
econômica, social e jurídica.
Fechar
os olhos ao universo em transformação é ter a atitude da avestruz.
Gaudêncio Torquato é jornalista, professor
titular da USP, consultor político e de comunicação Twitter @gaudtorquato
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